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Em vez de danificarmos os ecossistemas, porque não começar a criá los?
propõe a Professora Jacqueline McGlade
“Em vez de danificarmos os ecossistemas, porque não começar a criá‑los?”, propõe a Professora Jacqueline McGlade. “Dispomos da tecnologia e das competências necessárias ao nível da concepção. Encontramos exemplos do futuro por toda a Europa, mas são apenas nichos de inovação. Temos de partir destes nichos de inovação para criar as cidades do futuro.”
“A luz, por exemplo, é um recurso natural. As pessoas gostam de viver e trabalhar rodeadas por luz natural. Os edifícios podem facilmente aproveitar muito mais a luz natural. Temos também o exemplo dos jardins verticais. A criação de jardins verticais implica transformar as nossas cidades em quintas urbanas sustentáveis, onde as culturas são produzidas no topo e dentro dos nossos edifícios.
A ideia de paredes vivas e canteiros verticais é muito antiga, remontando aos Jardins Suspensos da Babilónia. É extraordinário que não tenhamos aplicado mais cedo este conceito mas, agora, é mais urgente do que nunca mudarmos os nossos hábitos devido às alterações climáticas”, diz a Professora McGlade.
Nas cidades, a temperatura é mais elevada porque as estruturas de betão e os pavimentos alcatroados absorvem o calor e libertam‑no lentamente, o que conduziria a estações vegetativas mais longas e a uma melhoria da produção. Poderiam ser instalados sistemas de captação de águas pluviais nos telhados e uma rede de condutas permitiria que as águas escorressem através de cada nível. As plantas também teriam um efeito isolante, mantendo o espaço no interior do edifício fresco no Verão e quente no Inverno.
A população global está a aglomerar‑se nas nossas cidades. Prevê‑se que, em 2050, 80% da população mundial (que, segundo as estimativas, será de nove mil milhões de pessoas) viverá em zonas urbanas. Muitas das nossas cidades enfrentam graves problemas sociais e ambientais resultantes de pressões como a concentração de massas, a pobreza, a poluição e o tráfico.
A tendência para a vida urbana deverá manter‑se. A nível mundial, as cidades ocupam apenas 2% da superfície terrestre, mas acolhem metade da população global, tw(20) Na Europa, 75% da população vive nas cidades. Esta percentagem deverá aumentar para 80% até 2020. Actualmente, as cidades europeias são responsáveis por 69% do nosso consumo de energia e, como tal, pela maioria das emissões de gases com efeito de estufa. O impacte ambiental das cidades faz‑se sentir por toda a parte, dado que estas dependem de outras regiões para satisfazer a sua procura de energia e recursos e para receber resíduos. Um estudo sobre Londres(21) estima que a pegada de carbono desta cidade é 300 vezes superior à sua área geográfica – o que corresponde quase ao dobro da área de todo o Reino Unido. Muitas vezes, a poluição das cidades afecta também áreas exteriores.
As alterações climáticas são uma nova ameaça à vida citadina. Algumas cidades serão gravemente afectadas pelas alterações climáticas. Este fenómeno poderá agravar as desigualdades sociais: os pobres encontram-se geralmente em maior risco e não dispõem dos recursos necessários para se adaptarem. As alterações climáticas também afectarão o ambiente urbano: a qualidade do ar e da água, por exemplo.
Como vimos, as nossas cidades e áreas urbanas têm vários problemas aos níveis social, ambiental e da saúde. Contudo, a proximidade de pessoas, empresas e serviços associados à própria palavra “cidade” proporciona também grandes oportunidades.
O ambiente urbano oferece importantes oportunidades para um estilo de vida sustentável. A densidade populacional das cidades implica já deslocações mais curtas para o trabalho e os serviços, maior utilização dos transportes públicos e habitações mais pequenas que requerem menos luz e aquecimento. Consequentemente, os habitantes urbanos consomem menos energia per capita do que os habitantes rurais.(22)
As nossas cidades encontram‑se igualmente numa posição única no que respeita à mitigação e adaptação às alterações climáticas. As características físicas, a arquitectura, a governação e a localização de uma cidade são apenas alguns dos factores que podem contribuir para facilitar ou dificultar ambas.
As abordagens de engenharia – tais como os diques – são, sem dúvida, apenas uma parte da solução. A adaptação exige igualmente uma reformulação profunda do modo como concebemos a arquitectura e a gestão urbanas, devendo ser integrada em todas as políticas conexas, nomeadamente no domínio do uso do solo, habitação, gestão dos recursos hídricos, transportes, energia, igualdade social e saúde.
Se reformularmos a arquitectura, os transportes e o planeamento urbanos, poderemos transformar as nossas cidades e paisagens urbanas em “ecossistemas urbanos” que estarão na primeira linha da mitigação das alterações climáticas (melhores transportes, energia limpa) e da adaptação às mesmas (casas flutuantes, jardins verticais). Um melhor planeamento urbano permitirá melhorar a qualidade de vida de toda a população e criar novas oportunidades de emprego, na medida em que preparará o mercado para novas tecnologias e para uma arquitectura verde.
A chave reside em planear as cidades de modo a facilitar uma redução do consumo de energia per capita, recorrendo a meios como transportes urbanos sustentáveis e habitações com baixo consumo de energia. As novas tecnologias no domínio da eficiência energética e dos recursos renováveis, tais como a energia solar e eólica e os combustíveis alternativos, também são importantes, o mesmo acontecendo com a criação de oportunidades para as pessoas e as organizações mudarem o seu comportamento.
“A única certeza que temos é que o futuro será diferente daquilo que esperávamos. Estamos a planear para essa incerteza”, diz Johan van der Pol, director-adjunto da Dura Vermeer, uma empresa de construção civil holandesa que está encarregada da concepção e construção de Ijburg, um novo distrito flutuante em Amesterdão.
Ijburg é um dos projectos mais ambiciosos alguma vez lançados pelo município de Amesterdão. A expansão demográfica e a subida do nível da água forçaram esta cidade com uma elevada densidade populacional a ser criativa, fazendo experiências com novos tipos de arquitectura na própria água. As novas casas estão “ancoradas” a passadiços flutuantes e dispõem de ligações às redes de distribuição de electricidade e água e aos serviços de saneamento. Estas casas podem ser facilmente transportadas para outro lugar, dando um novo sentido à expressão “mudar de casa”. A nova cidade conta com estufas flutuantes ecológicas, onde são produzidos diversos tipos de frutos e legumes.
As casas flutuantes de Ijburg são apenas um exemplo de um novo movimento no domínio da arquitectura e do planeamento urbano. O impacte das alterações climáticas vai desde secas e ondas de calor no Sul da Europa a inundações no norte. As cidades têm de se adaptar. Ao invés de se limitarem a reforçar os diques ou importarem água, alguns arquitectos, engenheiros e urbanistas estão a estudar uma abordagem totalmente nova à vida urbana e citadina. Estão a tratar as paisagens urbanas como os ecossistemas urbanos do futuro.
Paris está cada vez mais doceO telhado da Ópera de Paris acolhe colmeias há 25 anos. A colónia nesta emblemática instituição parisiense está em franco crescimento e produz quase 500 kg de mel todos os anos. As abelhas citadinas estão a prosperar, existindo 400 colónias na cidade. Foram também instaladas novas colmeias no Palácio de Versalhes e no Grand Palais. Os jardins e parques citadinos estão repletos de árvores e plantas de flor. E, embora a poluição seja uma realidade, existem muito menos pesticidas nas cidades. As abelhas urbanas parecem estar a sair‑se melhor do que as suas homólogas rurais na Europa. Em 2005, a Associação Nacional de Apicultores francesa lançou uma campanha – a operação “Abelha, Sentinela do Ambiente” – com o objectivo de integrar as abelhas na paisagem urbana. Parece estar a resultar. Segundo as estimativas da Associação de Apicultores, cada colmeia parisiense produz, no mínimo, entre 50 kg e 60 kg por colheita e a taxa de mortalidade das colónias situa‑se entre 3% e 5%. Por seu lado, as abelhas do campo produzem entre 10 kg e 20 kg de mel e registam uma taxa de mortalidade de 30‑40%. O fenómeno repete‑se em Londres. Segundo a Associação de Apicultores de Londres, as abelhas urbanas apreciam a abundância de árvores e plantas de flor, beneficiando ainda de uma utilização relativamente reduzida de pesticidas. Graças a estes factores e às temperaturas ligeiramente mais amenas, a estação apícola é mais longa e, em regra, mais produtiva do que nas zonas rurais. Este é um exemplo perfeito do potencial do nosso ecossistema urbano. |
“As cidades europeias enfrentam desafios distintos que exigem respostas distintas,” diz Ronan Uhel, chefe do programa “Natural Systems and Vulnerability” da AEA.
“As cidades que tomaram medidas precoces deverão ser aquelas cujos investimentos de adaptação obterão melhores retornos. Contudo, até à data, são poucas as cidades europeias que desenvolveram estratégias orientadas para a adaptação às “novas” condições geradas pelas alterações climáticas e, na prática, a implementação de medidas é, por enquanto, limitada, de um modo geral, a pequenos projectos”, acrescenta ele.
Outras cidades poderão não ter tanta sorte em termos de conhecimentos e recursos, pelo que necessitarão de um apoio e orientação contínuos. Nesta fase, seria fundamental melhorar o intercâmbio de experiências e melhores práticas entre as cidades.
“Thisted é uma pequena comunidade localizada no Oeste da Dinamarca que é auto‑suficiente em termos de energia. Por vezes, até fornece energia à rede pública nacional. Esta comunidade tomou nas mãos as rédeas do seu destino. Pode parecer algo filosófico, mas a verdade é esta: somos nós que fazemos o nosso próprio destino”, diz Ronan Uhel.
“Criámos sociedades de pessoas dependentes. Muitas vezes, a nossa ligação virtual ao ambiente natural, aos alimentos pré‑embalados e à água é apenas virtual. Precisamos de redescobrir quem somos e qual o nosso lugar na natureza.”
Um novo observatório ambientalNa AEA, acreditamos que, para resolvermos os nossos problemas ambientais, temos de colaborar com as pessoas comuns e perguntar de que forma estas nos podem “informar”. Agricultores, jardineiros, caçadores, adeptos do desporto – todos eles possuem conhecimentos específicos que estão prontos a partilhar. O “Eye on Earth” – uma colaboração entre a AEA e a Microsoft – é um portal interactivo que fornece informações em tempo quase real sobre a qualidade das águas balneares e do ar em toda a Europa, estando prevista a disponibilização de mais serviços. Este portal permite que os utilizadores dêem a sua opinião, complementando e validando (ou, em alguns casos, refutando) as informações oficiais. Ao promover a participação dos cidadãos e ao dotá‑los de informações relevantes e comparáveis, serviços como o “Eye on Earth” podem contribuir significativamente para melhorar a governação ambiental: http://eyeonearth.cloudapp.net/ |
20. Programa das Nações Unidas para o Ambiente, 2008
21. Greater London Authority
22. AIE, 2008
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